Este trabalho partiu da hipótese de que o levantamento dos livros mais lidos pelo público brasileiro forneceria um perfil desse leitor, isto é, seria possível conhecê-lo por meio do levantamento dos temas que mais lhe despertavam interesse, quando esse sujeito propunha realizar o ato de leitura. A partir da detecção desse universo de leituras procurei observar então quais são os textos mais lidos pelo público brasileiro e, por meio do aparato teórico-metodológico da semiótica, examinei os mais representativos para chegar a um provável “perfil” desse leitor. Como é impossível caracterizar os leitores propriamente ditos, parti da hipótese de que a escolha que ele faz do que lê é reflexo de seus interesses, valores e desejos.
Para poder traçar, portanto, um perfil do leitor brasileiro contemporâneo era necessário estabelecer um corpus que me fornecesse as informações das preferências desse leitor. Obviamente não há dados de registro do que se lê, nem das opções de leitura de grupos ou tipos de leitores. Sair a campo com um gravador debaixo do braço perguntando para as pessoas o que elas leem também não seria uma tarefa muito produtiva. Portanto, a única forma de obter dados sobre as preferências dos leitores comuns contemporâneos seria trabalhar com as listas dos livros mais vendidos que são publicadas em diferentes jornais e revistas brasileiros. Como pretendia então fazer o registro desses dados a partir da década de 1960, iniciei uma busca em algumas bibliotecas.
Ao iniciar o levantamento desse corpus, tive acesso a um jornal que se chamava Leia Livros. Constituído como um jornal marcadamente de editores, o Leia Livros não só refletia as preferências de leitura do leitor brasileiro como também exercia influência sobre as escolhas dos leitores. O primeiro número desse jornal mensal, saiu em maio de 1978 e perdurou, com algumas alterações de formato, até setembro de 1991, quando circulou seu último número, o 155. Como, porém, eu tinha o propósito de abarcar um período de tempo mais extenso que o das publicações de Leia Livros, foi necessário procurar outro veículo impresso que apresentasse listas de livros mais vendidos no Brasil antes do período inicial de Leia e depois de seu desaparecimento. Dessa forma, portanto, cheguei ao Jornal do Brasil, jornal publicado no Rio de Janeiro, que veiculava uma lista de livros mais vendidos no Brasil num caderno publicado aos sábados que se intitulava “Idéias”. Tal como o Leia Livros, o espírito do suplemento do Jornal do Brasil era divulgar os lançamentos do mercado editorial, o que era de grande interesse para as editoras e, por outro lado, influenciar o leitor na decisão de seleção de suas leituras. As listas dos mais vendidos refletem sempre esse propósito. O Jornal do Brasil começou a publicar, em agosto de 1966, as listas dos livros mais vendidos no “Suplemento do Livro”, caderno especial sobre livros publicado mensalmente por esse jornal. As informações desse suplemento do jornal foram registradas até julho de 2010,
quando esse periódico deixou de ser editado em papel e passou à versão digital. Ao longo desse tempo, o suplemento do JB mudou várias vezes de nome, até adotar o nome atual, “Ideias”, e, durante o período de fevereiro de 1976 a novembro de 1991, interrompeu a publicação das listas dos livros mais vendidos para o público brasileiro.
Como possuía registro de livros mais vendidos em dois diferentes veículos impressos, o jornal Leia e o Jornal do Brasil, optei por uma forma de agrupamento desses dois veículos. Para tanto, mantive integralmente o registro do jornal Leia (de maio/1978 a set./1991) e acrescentarei a ele o levantamento do período anterior e o do posterior (não coincidente com o do jornal Leia) do Jornal do Brasil (de ago./1966 a fev./1976 e de nov./1991 a jul./2010).
Com esses dados, portanto, procurei verificar o que o leitor comum brasileiro lê e quais são os fatores que determinam suas escolhas de leitura.
SOBRE O AUTOR:
Arnaldo Cortina é Doutor pela Universidade de São Paulo (1994), Pós-doutorado na Universidade de Limoges, na França (2001-2002), Livre-docente pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2006) e Pós-doutorado na Universidade Paris VIII, Vincennes, Saint-Denis, na França (2012). Atualmente é professor do Departamento de Linguística, do Programa de Pós-graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, câmpus de Araraquara, e bolsista de produtividade do CNPq. Coordena o Grupo de Pesquisa em Semiótica da Unesp e é membro pesquisador do Grupo Casa (Cadernos de Semiótica Aplicada). Desenvolve pesquisa na área de semiótica e análise do discurso, com enfoque específico para a questão da leitura. Até o trabalho de livre-docência privilegiou o tratamento do texto verbal, mas atualmente tem priorizado o exame dos textos sincréticos. Publicou o livro O príncipe de Maquiavel e seus leitores: uma investigação sobre o processo de leitura (Editora da Unesp 2000) e, mais recentemente, participou das seguintes coletâneas: Linguagem e políticas: Princípios teórico-discursivos (Contexto 2013), Círculo de Bakhtin: pensamento interacional, vol. 3 (Mercado de Letras 2013), Questões de leitura na sociedade contemporânea (Cultura Acadêmica 2013), Amazônia - Amazônias - Leituras, (Editora da Universidade Federal do Acre 2012) entre outros.